Mais uma turminha chegou por aqui, com destino à liberdade que não deveriam ter perdido.

Eles deixaram os viveiros de transporte voando e experimentando uma nova vida que já esperava por eles.

Os primeiros momentos são de reconhecimento, de experimentação, de teste para asas há muito em desuso.

Os primeiros voos são tímidos e discretos, às vezes curtos e sem controle.

Sabemos que o tempo os deixará mais fortes e prontos para se arriscarem do lado de fora das telas.

Neste momento, as telas de nosso viveiro são ainda um mal necessário.

Ali eles estarão protegidos de predadores mas, ao mesmo tempo, terão espaço pra se fortalecerem, em uma reprodução da vida livre.

Como sempre, são muitos os personagens, cada um com uma história, mas todas originadas da mesma atrocidade, da mesma covardia.

No final, todas as histórias são iguais. Foram capturados, trancafiados, escravizados e passaram tempo demais enjaulados e sem o direito à liberdade.

Entre os Estrelinhas, tínhamos apenas 3, mas todos eles com algumas peninhas pardas, indicando que são machos ainda jovens, recém capturados. Eles nascem pardos e, quando se tornam adultos, perdem as penas pardas, que dão lugar a uma mistura perfeita de branco e preto.

Eles são os Pandas de penas. A presença de áreas pardas é o indicativo da pouca idade. Ainda não trocaram totalmente a plumagem, o que significa que são adolescentes.

E talvez por isso, tenham vivido pouco tempo em cativeiro. As estrelinhas estavam entre os mais espertos. Flagramos alguns de seus voos, já seguros e consistentes.

Exploravam a fonte de água com a mesma vontade com que se penduravam nos ramos carregados de sementes, plantadas dentro do viveiro para dar a eles o treinamento necessário para a vida livre.

Coleiros e canários são sempre os mais numerosos. Entre eles, um solitário Bem-te-vi, ainda assustado, sem saber o porque de tanta covardia.

Trinca-ferros também chegam em grande número. A espécie tem sido uma das maiores vítimas do tráfico e dos criadores clandestinos.

Nenhum outro pássaro sofre mais com o cativeiro. A espécie habita bordas de matas e não costuma frequentar terreiros das casas. Eles são muito arredios e instintivamente procuram se manter longe das pessoas.

Quando capturados, eles se debatem tanto contra as grades que muitos morrem nos primeiros dias.

Para evitar as mortes, os traficantes os mantêm com as gaiolas cobertas, simulando uma noite sem fim. É esse o método de tortura usado para que os pássaros se submetam às grades, sem se matarem contra elas.

Nosso viveiro foi preparado para que a volta ao ambiente natural seja gradativa. Aqui eles fortalecem as asas e o espírito. Alguns dias são suficientes para se fortalecerem e retornarem para a mata, de onde não deveriam ter sido arrancados.

Chico, o Bem-te-vi, não era o único solitário. Havia uma pombinha, a quem demos o nome de Colombina.

O nome científico é Columbina Squammata, e significa pombinha com escamas. Chegamos a imaginar que o nome científico fizesse uma relação entre sua plumagem em escamas com a fantasia xadreza de uma palhacinha conhecida como Colombina (daí o nome que demos a ela).

Mas não há registro na literatura sobre essa ligação. Na verdade, Columbina significa Pomba e representa uma família inteira (Columbidae). A Rolinha-roxa (Columbina talpaciti) também leva a mesma referência no nome, embora não tenha nenhum sinal de xadrez.

Nossa menina é popularmente conhecida no País inteiro com vários nomes: Fogo-apagou, rolinha-cascavel, rolinha-pedrês, rolinha-carijó, rola-pintada, dentre outros.

E a referência às perigosas serpentes se justifica. A plumagem escamada se assemelha muito às escamas da cobra. A semelhança à roupa xadreza da palhacinha ficou por nossa conta, no nome que demos à nossa personagem.

Colombina é uma mocinha que chegou sozinha por aqui. A espécie vive em pares, às vezes sendo vistas em pequenos grupos familiares.

Assim que chegou, refugiou-se nos galhos da amoreira e ali ficou, se escondendo e tentando não ser notada.

Para a sorte da nossa escaminha, a região é cheia de rolinhas de sua espécie. Ela vai encontrar muitas assim que deixar o viveiro e poderá constituir uma nova família. É possível que ela tivesse uma família quando foi capturada.

Seja como for, a vida, aquela vida que ela teve um dia, não existe mais. A covardia do cativeiro arrancou dela tudo que já teve.

O objetivo agora é começar de novo.

Alguns dias depois de sua chegada, Colombina já estava mais confiante, já ciscava o chão, o banco do areia, sabia procurar bichinhos na terra e frequentava também os comedouros.

Do lado de fora, outras da espécie teimavam em frequentar os comedouros próximos do viveiro, dando à nossa palhacinha motivos pra ansiar pela liberdade.

Flagramos alguns flertes, com intensa vocalização. O futuro promete e teremos então um retorno à natureza, cheio de alegrias e glórias.

Ficaremos na torcida para que ela não se esqueça das torturas que viveu e que se mantenha realmente longe de grades, telas, armadilhas e, principalmente, das pessoas.

O período de aclimatação durou um pouco mais do que esperávamos, mas o fato é que conseguimos flagrar alguns voos de nossa palhacinha.

Ao final, ela estava realmente forte e pronta pra ganhar o céu.

O tempo de cativeiro parece ter sido mesmo esquecido e a “galinha pintadinha” poderá, finalmente, reencontrar o caminho.

O dia da soltura chegou os todos os nossos hóspedes estavam preparados e ansiosos pela abertura do Portal.

E com a janela aberta, os prisioneiros começaram a sair, um a um, lentamente, sem pressa, mas com determinação.

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