Uma foi achada em uma enxurrada e estava sendo “engordada” para ser levada à panela. O outro foi encontrado nas margens de uma estrada e alguém achou que resgatá-la seria a melhor escolha, e o menorzinho foi encontrado com crianças, capturado em um ribeirão qualquer.
O Cágado de Barbicha é uma espécie silvestre e pode ser encontrada em toda a região Sudeste.
Não importam os caminhos, mas a vida se encarregou de unir os três e fazer com que chegassem a nós.
Chegaram por aqui num fim de tarde. Precisávamos improvisar um recinto até a manhã do dia seguinte. Não era exatamente um “recinto”, mas foi o melhor que deu pra fazer. Passaram a noite ali.
O Cágado de Barbicha é uma espécie semi-aquática, que passa boa parte do dia ao sol. O equilíbrio térmico é uma luta constante na vida dos répteis.
As pessoas não imaginam a tortura que cometem, quando submetem estes animais a uma vida em cativeiro.
E não dá pra entender as razões de tamanha imbecilidade. Silvestres não são pets. Não interagem, não criam vínculos afetivos, não correspondem aos nossos sentimentos.
Esses animais são instintivos demais e são capazes de retomar a vida livre mesmo depois de 20 ou 30 anos em cativeiro.
O fato é que tínhamos um lugar para soltá-las.
A grandona recebeu o nome de Lurdinha. Pra ela, a viagem foi tensa e estressante. Ela chegou a botar meia dúzia de ovos. Não eram ovos fecundados porque até a noite anterior, ela estava sozinha e não tinha ainda conhecido Zé Chico e Jãozim.
Anos haviam se passado desde que foram capturadas. Se comparado com os tantos quelónios que passam a vida confinados em um balde ou bacia, sem ver o sol, comendo o que as pessoas ignorantes presumem que podem comer, os nossos protegidos tiveram sorte.
Eles estavam em recintos bem preparados e tinham alimentação equilibrada e adequada.
Mesmo assim, mereciam a liberdade.
Além da Lurdinha, recebemos também o Zé Chico, outro Cágado de Barbicha adulto, pouco menor que a matriarca da nova família.
E havia também o Jãozim, um pequenino filhote da espécie, que não media mais que 10 centímetros.
Depois de alguns minutos observando o ambiente, eles decidiram, um a um, se refugiarem na água.
Lurdinha foi a primeira a se arriscar.
Logo depois, Zé Chico decidiu acompanhar sua nova companheira.
E por último, o moleque Jãozim, lembrando um bordão de uma animação antiga, que dizia: “Esperem por miiiiimmmm”.
Por algumas horas, elas ficaram por ali, se aclimatando à água gelada que desce da montanha.
Não serão as únicas da família a ocuparem aquele território.
Por lá já vive uma tigre d’água, que ali chegou com as próprias pernas. Trata-se de uma espécie exótica, introduzida ilegalmente por pessoas que as adquiriram como animais de estimação e, depois que cresceram, as soltaram em áreas rurais.
Algumas sobreviveram e se adaptaram ao clima e à topografia irregular de nossas montanhas.
Essa prática é ilegal, considerada crime ambiental.
Mas a Maricota, nome que decidimos dar à forasteira, antes de sabermos que ela era gaúcha, chegou por ali com as próprias pernas e se mostrou muito arisca. Ninguém conseguiria captura-la. Mas isso não importa, pois nunca pensamos em retirá-la de lá.
Se, apesar de tudo o que passou, conseguiu sobreviver e se adaptar, chegando ali sozinha, tem o direito de viver. Não tem culpa por ter sido retirada de seu habitat e solta em terras distantes.
Não sabemos se Lurdinha, Zé Chico e Jãozim continuarão por ali. Talvez sigam outros caminhos.
Mas esperamos que as pessoas que ainda insistem em ter animais silvestres em casa entendam a covardia que representa retirar a liberdade de um “bicho do mato”.
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