ATUALIZANDO: Todos os 48 Pit Bulls foram resgatados. Ao final de 2 anos, todos haviam sido ressocializados e adotados.

Abaixo a história completa, desde o resgate.

O título sugerido desta matéria ia de “Santuário dos Pit Bulls”, a “Inferno dos Pit Bulls”.

Chamar de Santuário seria sacrilégio, e de Inferno seria amenizar as coisas para o criador desse lugar. Já vimos coisas piores, mas relento e correntes de 20 quilos em cada pescoço eram demais pra qualquer coração.

O lugar é longe de tudo e não chegaria aos olhos das autoridades, se não fosse por uma denúncia. Que fique claro que a ação aqui foi do Ministério Público e da Polícia Ambiental, juntamente com a UFMG. Somente órgãos oficiais, com poder de polícia, poderiam agir em casos assim.

De longe, parecia um criatório mal sucedido, que não conseguiu vender os filhotes, que cresceram e se multiplicaram, e ficaram fora de controle. Como eram Pit Bulls, pra evitar brigas (ledo engano que elas eram evitadas), que poderiam ser sangrentas, os animais, já adultos (adolescentes também), eram mantidos acorrentados, a certa distância um do outro, contando com uma casinha individual que não lhes protegia de nada.

Outra incoerência: Se ficavam amarrados e distantes um do outro, os nascimentos não eram exatamente indesejados.

Voltando às primeiras impressões, eram Pit Bulls e, como viviam acorrentados, esperava-se que fossem bravos e que recebessem com hostilidades visitantes desconhecidos.

Entretanto, diante das primeiras tentativas de aproximação, encontramos animais amedrontados, apavorados diante de um simples pedido de amizade.

Isso significa apenas uma coisa: o manejo ali não é gentil.

Não é possível que animais tão fortes e majestosos tenham referências tão ruins das pessoas, a ponto de sequer ameaçarem usar os dentes. Os rabinhos apoiavam-se entre as pernas e o olhar de pavor parecia dizer:

__Onde eu vou, tio? Não quero ir, não quero briga.

Naquele lugar remoto, no meio do nada, além daquelas casinhas mal arranjadas, havia outra estrutura, de alvenaria.

Um cercado maior e coberto, onde alguns empregados esclareceram que era o local onde as vacinas eram aplicadas. Ao lado, outra estrutura, de madeira, um conjunto de pequenos recintos, antigo e claramente em desuso, mas conhecido. É um local específico para acondicionar galos.

Olhando um pouco mais de perto, dentro daquele recinto das “vacinas”, havia marcas que pareciam pinturas rupestres.

Infelizmente, não era decoração que simbolizasse um tempo remoto, quando a amizade entre lobos e homens deu seus primeiros passos.

Eram marcas que se espalhavam por todo o interior, concentrando e se intensificando nos cantos, onde os mais fracos se refugiam.

Não são pinturas rupestres, nem mesmo modernas, e nem simbolizam amizade. Pelo contrário, são marcas da insanidade humana, que não tem limites para a maldade.

O medo daqueles cães fortes começava a fazer sentido.

As cicatrizes nas faces de vários deles eram também sinais claros do que todos ali se recusavam a acreditar.

Aquelas marcas não foram acidentais. Eles não se feriram sozinhos. Eles não se pegaram sem que mãos humanas tivessem proporcionado.

As correntes eram um caso à parte. Devem pesar em torno de 20 quilos, para cada pescoço. Grossas e pesadas, muito pesadas.

Os canis não protegiam de nada, nem do sol, nem da poeira, nem do vento, nem do calor ou do frio, e menos ainda da chuva.

O estrago que o peso das correntes fazia no chão de terra batida dava uma pequena noção do que provocavam nos pescoços dos animais.

As marcas na terra eram profundas.

Só não eram mais fundas que as marcas deixadas pelas patas dos animais, nos locais onde eles podiam caminhar.

É possível ver, claramente, a arena redonda onde os cães caminham, sempre com a corrente esticada, num semicírculo de raio igual ao comprimento das correntes.

Na foto abaixo, é possível notar que a profundidade do local onde caminham, em relação ao terreno inatingível, chega a provocar sombra. Há um desnível de, pelo menos, meio metro.

Essas marcas não se formaram em pouco tempo. Eles estão há anos no mesmo local. Pior que isso, os cães não parecem velhos, o que significa que aquelas marcas, de quase meio metro de profundidade, não foram feitas por um único cão.

Muitos cães passaram pela ponta da mesma corrente. Talvez os óbitos ali sejam mais constantes do que podemos imaginar.

Procuramos também por sinais de comida e água. Todos tinham água suja, que eles bebiam pra não morrerem.

O único sinal de comida foi uma sopa vomitada, que parece um amontoado de arroz com qualquer coisa.

As costelas aparentes em vários deles indicavam claramente escassez alimentar.

Nas casinhas, algumas com piso em concreto, e outra de terra batida, que os cães escavavam, na tentativa de fazer um ninho, pra suportar as temperaturas baixas da madrugada.

Segundo exames dos veterinários, vários tinham hipotermia.

Flagramos também filhotes, alguns com 5 ou 6 meses de vida, ainda agitados e alegres, fazendo festa, pulando e abanando o rabinho pra todos.

Infelizmente, dos quase 50 cães existentes ali, naquele primeiro momento somente foi possível conseguir vagas nos hospitais para 16 deles. E na hora de decidir, o critério foi exclusivamente técnico: os mais debilitados e necessitados de atendimento médico foram os selecionados.

Os filhotes terão que esperar até que estes primeiros resgatados sejam adotados.

Diante de tanta tristeza, havia uma luz no fim do túnel. Embora arredios com outros cães, pois foram treinados pra isso, com as pessoas, eles são dóceis, muito dóceis.

Chegam a ser carentes ao extremo, de pedir colo e se esfregar nas pernas dos visitantes.

Alguns até chamam pra brincar, mesmo na ponta da corrente.

Este caramelo abaixo agarrou nas pernas de quem o fotografava, como se pedisse: __Me tira daqui?

Não pode haver cachorro mais carinhoso no mundo. O medo que eles sentiam despareceu assim que iniciamos a interação. Bastaram alguns afagos, pra eles sentirem que algo era diferente naquela visita.

Infelizmente, não foi possível resgatar todos.

Os escolhidos acomodaram-se nas caixas de transportes, sem resistência, como se soubessem que a vida  iria mudar.

Os que ficaram precisaram esperar. Era preciso mobilização, muitas adoções, lares temporários e clínicas veterinárias.

A intenção era doar os primeiros e buscar o restante. Infelizmente, a adoção não veio tão rápido quanto necessária e os resgates ocorreram aos poucos. Ao final, todos haviam sido retirados daquele inferno, receberam cuidados necessários e até adestramento, mas infelizmente, tiveram que continuar confinados.

Não mais em correntes, mas em pequenas baias de parede. Esperam por adoção e por dias melhores. Até lá, que protetores invisíveis os confortem.

Abaixo, estão alguns dos focinhos que esperam por adoção.

Esperamos que eles se tornem bem conhecidos e que logo tenham a chance de um recomeço.

Alguns deles precisam ser filhos únicos, por razões óbvias. Eles aprenderam coisas tristes. Talvez possam ser ressocializados, mas neste momento, é mais prudente que sejam mesmo filhos únicos.

Não queremos que sejam doados para guarda. Eles passaram tempo demais como gladiadores escravos e precisam agora de uma família, pra serem estimados. Eles precisam de companhia, pra aprenderem que os homens são bons e que aqueles que conheceram não servem como referência.

Estão prontos pra aprenderem sobre afeto, sobre homens e lobos.

Abaixo, as fotos da operação de resgate.

No mesmo dia, já à noite, eles receberam os primeiros cuidados, por médicos que estavam de plantão, esperando a chegada deles.

Registra-se aqui um agradecimento especial às Clínicas e Hospitais Veterinários que abraçaram a causa e ajudaram na hospedagem e cuidado dos Pit Bulls resgatados.

Hospital Veterinário da UFMG, Hospital Veterinário da Faculdade Arnaldo, Clínica Veterinária Gutierrez, Hospital Veterinário da UniBH e Hospital Veterinário Santo Agostinho.

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