Cansei de tentar mostrar a beleza dos cães do abrigo. No caso da SMPA, talvez um choque de realidade dê melhor resultado.

E que fique claro, mais uma vez, que não é nossa intenção apontar o dedo. A culpa de tudo isso não é dos voluntários, dos veterinários que lá se desdobram, e talvez, nem mesmo da diretoria, pelo menos da atual. Este julgamento não cabe a mim.

A culpa é de uma sociedade inteira que continua abandonando animais na porta, que continua desprezando vidas. A culpa é de cada um que, mesmo se sensibilizando, continua adiando decisões.

Então lá vai…

Há duas semanas, estive na SMPA para resgatar alguns animais para serem preparados e levados para uma feira de adoções. Deveria escolher animais “adotáveis”, que tivessem mais facilidade de saírem em uma feira pública. Claro que os pretos médios e pelo curto estavam descartados.

Mas aí, uma lobinha começou a pular em mim, pedindo pra ser escolhida.

Eu a escolhi, mesmo sabendo que ela não tinha o perfil ideal para uma feira. Deixei o canil e a incumbência aos funcionários de pegá-la e colocá-la na caixa de transporte.

Quando chegou à casa da Lucinédia, onde seria preparada para a feira, ganhou o nome de Julinha, fiz novas fotos e preparei a matéria.

http://oloboalfa.com.br/julia-e-renatinha-agua-e-azeite/

Ela foi à feira e voltou, como já era esperado. Dias depois, quando revisava a matéria, notei que a lobinha que chegou à casa da Lucinédia e que recebeu o nome de Júlia, não era a mesma que eu havia escolhido.

O focinho branco me mostrava que os funcionários acabaram se confundindo e pegado a lobinha errada. Talvez a confusão tenha sido minha, que escolhi uma e apontei outra. Afinal, são todas muito parecidas e a Julinha que chegou à casa da Lucinédia era tão carente quanto a primeira.

Tudo bem. A solução seria buscar a Julinha número 1 na primeira oportunidade, que seria dentro de mais alguns poucos dias.

Segunda-feira, dia 20/05/2013, era dia de buscar mais 4 animais para uma feira que se realizará no sábado (25), na qual foram disponibilizadas algumas vagas para os animais da SMPA.

Era a oportunidade perfeita para que eu pudesse pegar aquela lobinha que me pediu ajuda em minha visita anterior. Procurei por ela mas ela não estava no canil. Ela não tinha nome e não havia como identificá-la. Então, perguntei apenas se eles tinham feito remanejamento, mas a resposta foi negativa.

Era pouco provável que tivesse sido adotada. Então, foi inevitável perguntar se teria ocorrido alguma baixa no canil.

E aí, a angústia me consumiu. Nos dois dias anteriores, sábado e domingo, a cidade estava em festa, em razão da final do campeonato Mineiro. Os malditos fogos, mais uma vez, fazendo vítimas.

Seis animais foram mortos durante a madrugada, em razão das brigas. Um em cada canil.

Um deles, no canil onde eu deveria pegar aquela lobinha que me pediu ajuda. Nunca vou saber o que aconteceu de verdade, mas a tristeza que senti não sei descrever. Ela me pediu socorro, talvez pressentindo que seus dias ali estavam contados.

Não costumo ignorar os sinais dos lobos e não ignorei. Eu a escolhi, cheguei a tirar suas fotos pendurada em minhas pernas, exatamente pra mostrar na matéria o porquê ela tinha sido escolhida.

Não sei que nome dar a isso. Desencontro, fatalidade, azar, destino. O fato é que ela pediu ajuda e eu não fui capaz de ajudá-la. Guardarei dela a imagem daqueles olhos expressivos pedindo que a tirasse dali.

Claro que alguém foi salvo em seu lugar. A Julinha é também uma lobinha especial, assim como aquela que não chegou a ganhar um nome. Um dia quero ser capaz de entender esses caminhos. Quem sabe aceitá-los?

A vida segue e, para os outros 200 que lá estão, bem lentamente. Outros lobinhos pretos de pelo curto e porte médio ainda estão lá. Voínha é o retrato da alegria. Talvez da inocência.

Se ela soubesse que é uma cadelinha SRD, preta, porte médio, pelo curto e que está na SMPA, ela não seria tão feliz.

Cachorro preto é o que não falta por lá. Eles são os que sobram, os que ninguém quer, os que fazem parte da paisagem urbana.

Esses dois precisam ser conquistados. O sujeito de cara amarela até que foi adotado. Ganhou uma boa casa, com jardim e tudo.

Mas aí, depois do longo confinamento na SMPA, achou que tinha que tirar todo o atraso de uma só vez e cavou alguns buracos no jardim. Foi devolvido, é claro, e está lá, triste como poucos.

Talvez arrependido da arte que fez e prometendo pra si mesmo que será o mais comportado lobinho da próxima vez, se houver próxima vez.

Quem sabe ele volta como bichinho de pelúcia?

Filhotes sempre foram um caso a parte na SMPA. Não é exagero dizer que poucos sobrevivem. Não tive coragem de entrar no canil dos pequenos. Assim que nos aproximamos do portão, eles se amontoam, se pisoteiam, latem e choram. Fazem de tudo pra chamar a atenção.

Eles não têm a consciência do que estão vivendo, mas talvez protetores invisíveis os estimulem a chamar a atenção dos visitantes.

Alguns preferem ficar afastados. Talvez já tenham aprendido que não adianta muito insistir. Outros, já não se levantam mais. Este é o desfecho esperado para cada um deles.

Mais uma vez, sou conduzido a fotografar animais morrendo. Mas acho que as pessoas ainda não entenderam o que é a SMPA. Continuam deixando filhotes na porta. Continuam amarrando fêmeas prenhas por lá. Continuam levando seus animais indesejados, acreditando, ou melhor, querendo acreditar (por conveniência é claro) que ali é um bom lugar.

E se filhotes comovem mais, aí vai.

Da última vez que estive lá, registrei a presença de uma numerosa família. Eu havia dado a ela o nome de Kate. Nove lobinhos estavam pendurados em suas tetas.

A tragédia estava anunciada. Registrei aquele momento na esperança de que fossem retirados de lá. Se apenas um vingasse já seria bom.

Infelizmente, só encontrei a Kate, muito magra, doente, morrendo em um canto. Não tinha forças pra se levantar. Um misto de depressão, tristeza e doença mesmo, talvez a mesma que vitimou cada um de seus filhotes.

E a história se repete. No mesmo canil, outra fêmea está prenhe, com uma barriga gigante. Tem caixa pra uns 10.

Espera a hora de despejar sua prole naquele inferno. Se nascerem ali, não vão sobreviver. Há quem diga que exagero, mas se não for assim, não vai. Tentei amenizar as coisas, mas os resultados estão longe do desejável. Poucas adoções, poucos protetores se envolvendo.

A SMPA grita por socorro. Sem uma mobilização em massa, histórias assim continuarão se repetindo, uma após a outra.

E nem só os filhotes sucumbem. Lobinhos miúdos não duram muito tempo, porque são mortos pelos cães maiores. Não há lugar adequado pra eles e por isso, acabam sendo mantidos isolados, onde for possível.

Desta vez, encontramos duas lobinhas de menos de 4 quilos cada uma. Ambas deixadas ali há poucos dias, amarradas na porta. Estavam muito magras, pele e osso. É evidente que não estavam comendo.

Pior que isso, assustadas e tremendo de medo. Mal conseguiam se firmar sobre as próprias pernas, tamanha a tremedeira. Ambas foram resgatadas.

Mara foi para a casa da Lucinédia. Ela ainda será castrada e vacinada antes de ser disponibilizada para adoção.

A outra é a Duda. Continuou lá mais um dia porque não tinha mais espaço no carro.

No dia seguinte, voltei para buscá-la. Passou por uma faxina na Veterinária Alípio de Melo, onde colheu sangue para exames, foi vermifugada e iniciou um tratamento para babésia, recebendo alta no dia seguinte.

Está agora em nosso território. Em mais alguns dias, será integrada à nossa matilha e passará por todos os procedimentos até ser disponibilizada para adoção.

Ela parece uma mestiça de Chiuaua de pelo longo, bem pequena. O único lugar onde ela talvez tivesse melhores chances de sobreviver seria entre os velhinhos e mutilados.

Pelo menos lá eles não têm dentes. Os que têm dentes, não têm todas as pernas e não conseguem pegá-la.

Aqueles olhos me olhando pela grade diziam muito. Ela é uma cadelinha jovem, mas já teve algumas crias e estava novamente no cio. Sua tristeza e apatia contagiavam. Já deve ter tido um dono e parece saber o que lhe fizeram.

Dividindo com ela o canil, mais uma cadelinha despedia-se da vida. Assim que a vi, achei que fosse mais uma que não andava.

Mas me disseram que ela anda, mas com dificuldade. Já é muito velhinha e não tem mesmo muito tempo de vida. O que mais dói é vê-la morrendo ali, naquele chão de cimento.

A verdade é que ela já desistiu. Tentei fotografar seus olhos. Ela os abriu e me olhou, mas não vi brilho neles. Não acredito que essa matéria vá fazer alguma diferença na vida dela. Mesmo que alguém veja e decida adotá-la, não vai adiantar. Existe um grau de tristeza que é irreversível.

Claro que eu queria muito estar errado. Que bom seria se surgisse alguém que a fizesse sorrir novamente! Mas…

Mesmo assim, vou chamá-la de Laila. Ela nunca vai saber que lhe dei um nome. Mas pelo menos aqui, nesta matéria, ela terá um.

O que se pode fazer? Afinal, cães velhos são abandonados todos os dias. As pessoas continuam descartando como objetos que não servem mais.

Se, para a Laila não há mais tempo, o Alfredo ainda pode aproveitar os jardins de uma casa. Ele anda com alguma dificuldade. Não tem nenhum problema, mas as pernas traseiras já estão bambas. É só reflexo da idade.

O Tobi, o cãozinho canguru, continua lá. Pretendentes ele até que conquistou, mas são pessoas que estão esperando mudar para uma casa, ganhar na loteria, a promoção no emprego, etc.

Ele não é o único. Muitos outros ali conquistaram pretendentes, mas entre a vontade e a ação vai um abismo. As pessoas precisam entender que eles não têm tempo. A vida de um cachorro dura em média 10 anos. Uma semana pra eles é uma eternidade.

Enquanto isso, a vida segue e o Tobi continua lá. Ele e outros tantos.

Então é isso. Esperamos com esta matéria sensibilizar mais alguns protetores. Se sonhar não custa, por que não esperar mais alguns veterinários do bem?

Lamento todos os dias por cada um daqueles animais. Eles são especiais. Estão ali por nossa culpa. As pessoas não sabem, ou não querer saber o que acontece lá dentro. Vou continuar mostrando, enquanto tiver forças, mesmo que me pareça inútil.

Os animais da SMPA continuam abandonados. Faltam voluntários, remédios, carinho. Falta oportunidade, esperança, expectativa de vida melhor. Falta tudo naquele lugar.

Se eles não têm muito tempo, nós também não. Vivemos hoje em um mundo de regeneração e não temos mais todo o tempo e quantas vidas precisarmos pra nos redimir. A hora é agora.

Resta-me agora rezar para que esta matéria chegue aos destinos certos, e que seja recebida com a mesma intensidade com que foi preparada.

Seja feita a Vossa vontade.

Pra quem chegou agora e quer se inteirar do assunto, seguem os links das três primeiras matérias.

http://oloboalfa.com.br/smpa/

http://oloboalfa.com.br/smpa-parte-ii-vacinacao/

http://oloboalfa.com.br/smpa-parte-iv-feira-permanente/

Contato para adoção: (31) 3433.0900. (09:00 às 11:00 e de 13:30 às 16:00).

Rua Jaguariba, nº 66, Bairro Guarani, em Belo Horizonte.

Horários: 2ª a 6ªs, das 08:30 às 11:30 e de 13:30 às 16:30 horas.

Sábados: Das 09:00 às 12:00 horas.

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